segunda-feira, 8 de setembro de 2008

O Menino do Mangue e os Caranguejos Fugitivos - Parte 2

[Leia: Parte 1 | Parte 3 | Parte 4]
_Comemos dúzias!!!

Esperando aquecer um pouco mais para sair atrás de uma fêmea, o caranguejo estava descansando em sua casa. Tudo estava normal e agradável no mangue, até que de repente um humano invadiu o habitat. O caranguejo ouviu a movimentação, mas permaneceu imóvel na proteção de sua toca. Antes que ele percebesse o tamanho da ameaça, sentiu algo lhe apertando a carapaça e foi puxado para fora com violência. Viu o rosto de Erbop apenas de relance antes de ser jogado no saco com mais outros de sua espécie. A confusão era geral. Todos queriam sair e por isso não paravam de se mexer e de bater as pinças. Nosso amigo caranguejo não conseguiu pensar em nada. Ficou paralisado vendo o saco fechar e levar a luz do sol.

Acolum contou o quanto ele odiava até o cheiro do caranguejo, principalmente o fedor do lixo no dia seguinte, e disse que não entendia como alguém poderia comer um bicho desses. _Cara... é um bicho horrível... tem 10 pernas... Antes que Acolum concluísse sua descrição, Maiag o corrigiu: _Não são pernas... são patas... pereiópodes... e as duas da frente são as pinças... estão mais para garra do que pra perna. Expressando surpresa pela definição científica, Acolum gargalhou e desafiou Maiag a definir por completo o “caranguejo”. Ela deu uma tragada, soltou a fumaça e começou: _Caranguejos... quarto signo astrológico do zodíaco... são crustáceos... bichos invertebrados que possuem o corpo protegido por uma carapaça... daí o nome crustáceos... do latim crusta... que significa carapaça dura... o da nossa região é o caranguejo-uçá... Ucides Cordatus... de coloração azulada, arroxeada ou avermelhada.

_Meu Deus do céu – Acolum falou sorrindo – que é isso? Como você sabe tudo isso? Cheio de orgulho de sua esposa, Gaiom contou que ela fez uma pesquisa para umas garotas da faculdade e ficou sabendo muita coisa sobre caranguejos. Maiag apagou o cigarro em uma latinha que ela tirou do porta-luvas e agradeceu o elogio do marido com um beijo na boca. _Além disso - ela disse – caranguejo é coisa séria pra quem se diz ligado... pois ele faz parte da cultura... não só parnanguara... mas de todo o litoral do Brasil e de vários locais ao redor do planeta. Acolum se encostou no banco, acendeu um cigarro e perguntou se não tem perigo de acabarem com os caranguejos de tanto comerem. Após reclamar das variações no som do CD que seu irmão havia gravado, Gaiom diminuiu o volume da música e concordou com a preocupação de Acolum: _Já tem quem defenda a profissionalização da captura e até sua proibição, pois o consumo aumentou muito.

Espremido dentro do saco junto com mais algumas dezenas de outros caranguejos, o nosso caranguejo não parava de se mexer. Erbop jogou o saco no bagageiro da velha bicicleta, amarrou tudo com uma tira preta de câmara de pneu de caminhão e voltou sorridente pra cidade. Não precisou nem oferecer muito para vender toda a mercadoria. Para o último comprador, jurou de pé junto que os caranguejos eram de Guaraqueçaba: _Não senhor... pode acreditar... não são daqui não... meu primo acabou de trazer. O homem olhou os pés sujos do rapaz, coçou o queixo e aceitou a proposta. Depois de uma breve negociação, pagou o que achou justo por cinco dúzias e ainda levou mais três menorzinhos de graça. Largou o saco perto da pia ao lado da churrasqueira e foi preparar tudo para iniciar a limpeza.

Maiag lembrou aos rapazes que o aumento do consumo é apenas uma versão para o problema. Disse ainda que alguns cientistas afirmam não haver comprovação de que o consumo está acabando com os caranguejos. _Eles argumentam que as mudanças climáticas estão ferrando com a procriação dos caranguejos... além disso, mesmo que muitos digam que não abalou tanto assim, blá, blá, blá.. tem a questão do Vicunã... já esqueceram?

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